sábado, 14 de abril de 2018

Submissão – Michel Houellebecq


Há já algum tempo que tinha curiosidade em ler este livro e, sobretudo, em ler algum livro de Michel Houellebecq, um autor que é uma espécie de “enfant terrible” da literatura francesa, mas que tem visto muitas das suas obras premiadas com diversos prémios.

Ao ler este “Submissão”, entendi esse epíteto de “enfant terrible”, pois é notório a intenção de Houellebecq em provocar, uma espécie de ser politicamente incorrecto, estando-se completamente nas tintas para a opinião pública. O que ele pretende é abanar convicções, apontando claramente o dedo à sua sociedade.

Logo à partida a sua linguagem é crua, sem grandes floreados linguísticos ou literários, Houellebecq chega a usar vocábulos vernáculos, sobretudo de cariz sexual. Nesse ponto, é clara a intenção do autor em chocar, no entanto o que ele faz é simplesmente desenhar retractos do dia-a-dia de qualquer ser humano que não envereda por colocar máscaras sociais, logo e utilizando essa dialéctica, é normal que muitos leitores se identifiquem, nem que seja em segredo, com as suas personagens e com os retractos que ele vai pintando.

Dessa forma o livro torna-se, acima de tudo, divertido, face à constante provocação do autor que, por diversas vezes, parece que nos está a dizer: “sim, é de si que estou a falar”.

Neste título concreto, Houellebecq idealiza todo um contexto provável em que o partido político Fraternidade Muçulmana conquista o poder em França. O ano é de 2022 e, de repente, a sociedade francesa, por sua inteira culpa, vê o islão açambarcar o seu modo de vida e alterar tudo, tornando a França num país islâmico onde, obviamente, a lei islâmica terá de ser respeitada.

Agora imaginem o que é um país católico, no meio da Europa, tornar-se, de repente islâmico?

Só lendo!

 oda esta perspectiva é-nos narrada por um professor universitário, já quarentão, que vai saltando de casos amorosos em casos amorosos, quase todos com ex-alunas e prostitutas, e que nos vai narrando toda essa transformação.

Achei o livro muito interessante, sobretudo devido ao facto de existir diversos diálogos onde é efectuada reflexões sobre os valores da liberdade e da democracia e de como a religião, desde sempre, tem o condão de influenciar essa liberdade, sufocando-a e, na maioria dos casos, matando-a.

Livro que antecipa um cenário muito provável, se calhar mais provável do que a maioria das pessoas julga, julgo que Houellebecq poderia e deveria ter feito muito melhor e irei tentar explicar porquê.

A ideia é boa, bem como e como já referi, as várias explanações filosóficas e políticas sobre a importância da liberdade e da democracia, no entanto desde as primeiras páginas a sua principal personagem nunca me conseguiu cativar, quiçá mesmo, teve o condão de me criar até repulsa. Sendo um professor universitário, sempre esperei que a sua cultura fosse mais elevada do que a que vai demonstrando. Nesses diálogos, a atitude de François é quase sempre apática, parecendo sempre estar mais preocupado e virado para a sua satisfação sexual do que propriamente com o que o rodeia. A viagem que ele faz, sinceramente, não a entendi bem nem os cenários que ele vai observando. Francamente fiquei sem perceber do porquê dessa viagem e o posterior regresso a Paris. Depois são as constantes referências literárias, que admito ser interessantes, mas que não levam a lado nenhum, ou seja, fora de contexto, sem grande sentido, bem como com pouco sentido as insistentes alusões a Huysmans.

Sendo efectivamente um bom livro, um daqueles livros desafiantes que decerto não irá ser do agrado de leitores soft, sempre me pareceu que Houellebecq poderia, e tinha perfeitamente campo para isso, desenvolver mais, edificando provavelmente um romance épico mas que, como ficou, peca muito por essas falhas que apontei e que se torna um pouco decepcionante.

Ou seja, gostei mas não adorei.


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